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Levantem âncoras! Re-discussão portuária partiu máquina e deu marcha à vante!

Frederico Bussinger

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Não faz muito tempo testemunhamos episódio pouco usual: empresários, trabalhadores e Governo, juntos, celebraram a aprovação da “Nova Lei dos Portos” (Lei nº 12.815/13). Vale lembrar, ela resultou da MP-595 que foi anunciada não como mudança do marco regulatório setorial, mas como “Programa de Investimentos em Logística para Portos” em concorrida solenidade no Palácio do Planalto, naquele 6/DEZ/2012.

Os trabalhadores, apesar de mobilizações contrárias no início e, até, algumas greves (01, 02, 03, 04, 05), acabaram fazendo questão até de registrar o gran finale com um selfie coletivo ante a mesa do Senado. E havia razão para tanto:

Num aceno tipo “senta-que-o-leão-é-manso”, já partiram com a garantia de que “…todos os direitos dos trabalhadores estão preservados. Sem qualquer alteração na legislação trabalhista em vigor” (01, 02, 03, 04, 05). Todavia, além disso e ao longo da tramitação (01, 02), foram sendo incorporadas diversas “conquistas”, destacando-se o estabelecimento de renda mínima (art. 43 § único), de aposentadoria especial (art. 73), e inclusão da capatazia (trabalho em terra) entre as “exclusividades” e contratação no OGMO (art. 40 – caput). Mas, principalmente, a caracterização da capatazia, estiva, conferência, conserto de carga, bloco e vigilância como “categoria diferenciada” (art. 40; § 4º – abrindo a possibilidade dos sindicatos representarem e negociarem tanto dentro como fora dos Portos Organizados).

O setor empresarial foi o grande protagonista das mudanças e parceiro do Governo Federal na empreitada. Participou do processo e apoiou a formulação, a estratégia e a celeridade da aprovação da MP (01, 02, 03, 04, 05). Esteve presente na tramitação e forneceu subsídios. Chegou a esboçar divisão interna mas, quando a tramitação correu riscos de “morrer na praia”, esteve sempre a postos para anabolizar o processo; inclusive com ampla campanha pela grande mídia. Logrou seu objetivo (tático?): a liberdade dos TUPs para movimentação de “cargas de 3º”.

O Governo tinha mesmo o que celebrar (01, 02). E por, pelo menos, 2 razões: i) após longas e polarizadas discussões (01, 02) (com direito até a galinhadas na madrugada – 01, 02, 03 – para manter as energias dos congressistas!), alguns impasses, forte empenho (01, 02, 03), e votações tensas nas quais tentativas de modificação foram sucessivamente sendo derrotadas (por orientações diretas da Casa Civil), ele acabou por ter o que muitos consideram a maior das vitórias congressuais do Governo-Dilma (e, talvez, também, o ponto de inflexão nas conturbadas relações Dilma-Cunha); ii) ele consumou o objetivo que ensaiava desde a promulgação do Decreto nº 6.620/08 (apesar dele ter sido “vendido” como motivado pela “solução do problema da carga própria”); qual seja: a hiper-centralização do processo decisório .

Aliás, um dos momentos marcantes da tramitação legislativa, naquele 1º semestre de 2013, foi justamente a discussão centrada nesse tema, entre Eduardo Campos (então Governador de Pernambuco) e Gleisi Hoffmann (então Ministra-Chefe da Casa Civil – quartel general da MP), na Comissão Especial.

Mas tudo isso já vai ficando na poeira da história…

Intrigantemente, pouco mais de 3 anos depois, insatisfações e críticas se acumulam – aliás, muito cedo, já antes de completar seu 1º aniversário, a nova Lei ficou órfã!

Trabalhadores, p.ex., por constatar que os efeitos da “categoria diferenciada” são aquém do esperado (principalmente em portos com Terminais de Uso Privado – TUPs contíguos) ou pela perda de espaço dos TPA (avulsos); agora, inclusive, com julgado do TST que prevê percentuais crescentes.

Empresários arrendatários (dentro dos Portos Organizados), que adotaram “perfil baixo” durante a tramitação da MP/Lei, procuram formas para também usufruírem das vantagens competitivas que o novo modelo propiciou aos TUPs (algo mais que previsível desde a emissão da MP!): querem isonomia! E, como de praxe, muitos dos representantes de TUPs e arrendatários, em geral, ressuscitam velhas bandeiras de liberdade quase “ampla-geral-e-irrestrita”, privatização das Docas, etc. (01, 02, 03, 04). Aliás, vez por outra, falam de “uma nova Lei dos Portos”.

O Governo, tanto o que gestou a lei vigente como o por ora interino, preocupados porque o novo modelo não “entregou” o prometido, buscam saídas para “destravar” o setor. O foco, a métrica são novos investimentos, seja em arrendamentos (novos e renovações antecipadas), seja em TUPs, IP4, ETC ou dragagem.

Enfim, com motivações e objetivos diversos, tudo indica que, mais uma vez, estamos prestes a zarpar rumo a uma nova viagem reformadora!

Para que se minimize o risco de se repetirem erros das experiências anteriores, vale refletir sobre alguns aspectos. Um bom e consensado diagnóstico é essencial:

1) A lei é consequência! A discussão necessária, e raramente feita de forma ampla, profunda e transparente, é de modelo. Estabelecido um modelo, a redação do texto legal ou normativo não chega a ser tão difícil assim.

2) Modificações pontuais, sem uma visão global do modelo, pode produzir colchas de retalhos … como tem acontecido.

3) Clareza em relação ao modelo é importante até mesmo se a opção estratégica for de mudanças infraconstitucionais e/ou infra-legais: para que sucessivas decisões/modificações sejam harmônicas e não demandem re-trabalhos sobre re-trabalhos. Para que não se tenha que se voltar a discussões estruturais a cada década (ou em menores intervalos)!

3) As agendas ocultas precisam ser postas à mesa para viabilizar uma ampla, consistente e transparente discussão; essencial para que a solução resultante tenha legitimidade. E, com isso, p.ex., dificulte precoces esquecimentos e/ou arrependimentos. Também para que uma eventual tramitação legislativa tenha mínimas chances de sucesso em um Congresso com agenda tão congestionada e nervos à flor da pele.

4) A utilização de experiências estrangeiras demanda, desde logo, honestidade intelectual. Depois, precisam ser contextualizadas institucional, econômica, política… e, até, culturalmente. Duas boas referências sobre o tema, sobre as tais das “boas práticas” (que tanto podem ser uteis nessa empreitada!), são: o manual do Banco Mundial de Reformas Portuárias e o relatório de uma pesquisa da “European Sea Port Organization – ESPO” sobre governança portuária (com uma nova versão recém-lançada).

5) A gestão privada tem suas virtudes. Tão ou mais importante que ela, todavia, mostram as experiências mundo afora, é a autonomia portuária; a descentralização do processo decisório… totalmente comprometidas com o modelo balizado pela Lei nº 12.815/13.

6) Certamente a conjuntura política e econômica tem contribuído para o insucesso de leilões portuários (como, também, em outros setores infraestruturais) e para investimentos nos portos públicos. Mas não é a única causa e, quiçá, nem a mais importante. Se fosse, os TUPs não estariam “bombando”; pois também estão sujeitos a ela. Há equívocos e lacunas na modelagem (01, 02, 03, 04, 05, 06, 07), p.ex. Há muito que precisa ser repensado!

Como na experiência do processo que resultou na Lei nº 8.630/93 (a antiga “Lei dos Portos”), mais que sucessivas conversas bilaterais e de alcovas, o estabelecimento de uma mesa retangular (governos + usuários + empresários + trabalhadores) poderia ser um caminho (bem!) construtivo.

Frederico Bussinger

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