2) Após algum tempo, todavia, parece que vai surgindo e se consolidando uma sensação/avaliação de processo incompleto ou, mesmo, de desvios de objetivos, de ineficácia … a justificar e acumular forças, dialeticamente, para um novo tsunami.
3) Há razões mais abrangentes e complexas. Mas também algumas aparentemente pontuais, secundárias ou consideradas irrelevantes que podem estar contribuindo para tal padrão; para tais frustrações. Muitos dogmas também.
4) Identificá-los, analisá-los, examinar alternativas, é o escopo de alguns artigos que serão publicados a partir da próxima semana (focados, principalmente, nos serviços públicos e infraestruturas; na mobilidade e logística): Uma contribuição a esse “passar a limpo”.
“Daqui pra frente,
Tudo vai ser diferente…”
(Roberto Carlos – “Se Você Pensa”)
“Nós estamos inventando a vida,
Como se antes nada existisse…”
(Taiguara – “Geração 70”)
Tal qual um tsunami, de tempos em tempos uma sanha de “passar a limpo” o País toma conta da cena brasileira. Há muito de similar entre elas: Tem-se como brotado da sociedade; sabemos o que está errado e como corrigí-lo; haveria um grande consenso a respeito (a história de Ricúpero sobre o fim da escravidão dá o que pensar!); e a perspectiva (ou esperança?) é que “desta vez vai”.
Será?
Só no último meio século passamos pelos movimentos que culminaram com o 64, as “Diretas-Já”, a Constituinte e o impeachment de Collor (incidental e ironicamente o primeiro presidente já sob a nova Constituição).
Tais processos, em geral, focam grandes bandeiras, grandes temas-meio; questões instrumentais: São rearranjos estruturais no campo institucional (formas de eleições, organização partidária, relações federativas, etc); de governança do setor público (estruturas governamentais, interfaces público-privado, controles, regulações); das inter-relações de variáveis macroeconômicas (os tais “5 preços”: Juros, câmbio, inflação, salário e lucro). E, lógico, normalmente embalado pela atávica e inefável corrupção (ou combate a ela)!
Não está claro, ainda, qual a prioridade, extensão e profundidade das reformas em curso; e aquelas no horizonte próximo. Mas, muito provavelmente, envolverão algum subconjunto desse cardápio.
Entremeados, ou paralelamente, aos debates desses temas-meio, planos/projetos são concebidos e apresentados visando enfrentar questões/gargalos específicos do momento que, ao fim e ao cabo, imagina-se, nos conduzirão à uma economia forte, uma sociedade justa… e, mais recentemente, a um espaço físico e a uma vida sustentáveis. Afinal, não é esse é nosso (brasileiro) inexorável futuro? É, apenas, uma questão de tempo… nos tranquilizamos; nos fortalecemos interior e coletivamente!
Quem não se lembra, p.ex., do “Brasil-Potência” dos militares? Do enxugamento do Estado e das aberturas do Collor? Dos planos econômicos e da desburocratização do Sarney? Do “Plano-Real”, da aceleração das desestatizações e da responsabilidade fiscal de FHC? Da anabolização de programas sociais, do Pré-Sal e do PAC de Lula/Dilma?
Vale um flashback: Durante algum tempo as ações governamentais, a pauta parlamentar, os espaços da mídia, os debates nos diversos fóruns da sociedade são praticamente tomados pela pauta do momento. As agendas de entidades, de movimentos sociais, das empresas e, mesmo, pessoais passam a adotá-la como referência balizadora. Brotam neologismos. Categorias de análises são enfatizadas ou, mesmo criadas. Instrumentos gerenciais, metodologias de elaboração de planos e orçamentos, modelos para a interface público-privado são ajustadas e/ou concebidas para os novos objetivos-fins estabelecidos.
Passado algum tempo, todavia, nos vales entre tais picos, parece que vai surgindo e se consolidando uma sensação/avaliação de processo incompleto, de sub-resultados ou, mesmo, de desvios de objetivos, de ineficácia … a justificar e acumular forças, dialeticamente, para um novo tsunami.
Nesse processo, a par das macro-agendas, dos macro-processos, algumas pautas setoriais são destacadas e desenvolvidas; muitas delas com padrão similar, mas processos próprios. Isso ocorreu, ocorre e deverá ocorrer em vários setores da vida nacional no futuro próximo.
Tome-se, p.ex., o caso do setor portuário brasileiro: Um novo ciclo de reformas (01, 02, 03, 04, 05), aparentemente anabolizado pelas Diretas-Já”, pela Constituinte e, principalmente, pelas aberturas na passagem dos anos 80 para 90, acabou por estabelecer um novo modelo, balizado pela “Lei dos Portos” – aprovada e sancionada em 1993.
Agora, 20 anos depois, nessa segunda década do Século XXI, um diagnóstico de incompletude/ineficácia voltou a dominar os decisores político-administrativos: A lei anterior não fora implantada, gargalos não haviam sido removidos, custos (portuários e logísticos) seguiam elevados, investimentos não estavam sendo feitos, as Cias. Docas não funcionavam/funcionam… justificaram as iniciativas e os esforços para se aprovar uma “nova Lei dos Portos“. Esta substituiu a anterior e abriu espaço para implementar ajustes estruturais profundos; praticamente um novo modelo portuário.
Por que tais processos/projetos não têm sido levados à cabo (ou, ao menos, achamos que não o são/foram)? Por que, no Brasil, temos ficado a meio caminho? O que leva a desvios de objetivos? Qual a razão da incompletude e/ou ineficácia de reformas tão importantes? E, de novo: Por que óbvio não acontece?
São perguntas às quais normalmente dedicamos, coletivamente, pouca atenção (talvez dificultado pela hegemonia da marquetagem!?!?!). Ou não temos respostas ou temos inúmeras – o que dá praticamente no mesmo. Nem sempre nos debruçamos para uma avaliação profunda da última empreitada, antes de embarcamos na próxima!
Certamente há razões mais abrangentes e complexas. Mas há, também, muitos modelos, instrumentos, normas, práticas… , aparentemente pontuais, secundários ou considerados irrelevantes que precisariam ser reavaliados. Muitos dogmas também. Será que, isoladamente ou em conjunto, não há neles contribuição para tal padrão? Para tais frustrações?
O debate dos grandes temas, das questões mais abrangentes já está em curso: A mídia, o parlamento, o governo, as redes sociais, as entidades e movimentos organizados, de uma forma ou de outra, em graus e em estágios distintos, já estão em campo e na ativa. Os próximos meses deverão ser palco de debates acalorados e relevantes para o futuro do País.
… uma oportunidade, também, de reavaliarmos nossas práticas e normas; de se questionar dogmas e modelos arraigados. Inclusive como forma de implementar as inflexões estruturantes.
Identificá-los, analisá-los, examinar alternativas, focado principalmente nos serviços públicos (que entraram na pauta já com os movimentos de 2013!) e infraestruturas; mais especificamente, ainda, em relação à mobilidade e logística, é o escopo de alguns artigos que serão publicados, nesta coluna, a partir da próxima semana: Uma contribuição a esse “passar a limpo”.
Em tempo: Sugestões e propostas temáticas são mais que bem vindas!
Frederico Bussinger é ex-Secretário de Transportes de São Paulo; Presidente da CPTM e Diretor do Metrô/SP.