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PERISCÓPIO 145: Transparência nas privatizações? Si, pero no mucho!


Frederico Bussinger

Para além do objeto em questão (acompanhamento pelo TCU da desestatização da Codesa e portos capixabas), uma recente decisão daquele tribunal (TC 029.883/2017-2), e seus desdobramentos, é rica matéria-prima para se entender e, até, se refletir sobre os processos decisórios para outorgas em portos e, mais amplamente, de infraestruturas logísticas no País: complexos, herméticos e com certo grau de imprevisibilidade. Em síntese:

Federação Nacional das Operações Portuárias – FENOP, Associação dos Operadores Portuários do ES – AOPES, Federação Nacional dos Estivadores – FNE, Federação Nacional dos Conferentes e outros – FENCCOVIB, e Federação Nacional dos Portuários – FNP, pleitearam ser admitidas como amicus curiae nos autos, “com poderes restritos à obtenção de cópias e apresentação de memoriais”. A FENOP, adicionalmente, requereu “acesso a todas as peças do processo, inclusive àquelas classificadas como sigilosas”.

A área técnica (Seinfra) propôs acatar a admissão como amicus curiae. Porém “com poderes restritos à obtenção de cópias de peças não sigilosas e apresentação de memoriais”. Os ministros, por sua vez, acordaram, por unanimidade, “…em informar à ANTAQ, BNDES, CODESA e MINFRA… que o processo seguirá o rito estabelecido na IN-TCU 81/2018…”.

Tal Instrução Normativa é objeto de artigos explicativos de diversos escritórios de advocacia, disponíveis na internet (p.ex: Justen e Matos Filho). E, também, de didática apresentação do/para o próprio TCU. Apesar de “sigilo” e “sigiloso”, salvo engano, não constar nem dos artigos nem da apresentação “oficial”, o certo é que, após vários meses, nenhuma das entidades ainda teve acesso à documentação. Nem mesmo à liberada… o que não impede que o cronograma estabelecido, lá no início, siga sendo ratificado em entrevistas e postagens.

Ouve-se que o TCU respondeu aos representantes das entidades nada poder fazer vez que, quem define ser um documento “sigiloso”, é o órgão que o gera (no caso, a SNPTA e/ou o MINFRA). Já, estes, teriam justificado o “sigilo” pela necessidade de, a partir da audiência pública, “haver isonomia; para que todos tenham conhecimento do edital e minuta de contrato simultaneamente”.

A margem de ritos e normas, há uma questão preliminar a esclarecer: cabe sigilo em um processo público? Como tal orientação se coaduna com a diretriz de transparência e, mesmo, com o primado da “publicidade” (previsto no art. 37, da CF)?

No caso de documentação dos proponentes, até pode-se entender (durante um determinado período do processo). Mas, em se tratando de documentação resultante de audiência pública, faz sentido? Vale lembrar que: i) nessa documentação há estudos/propostas já apresentadas previamente à audiência; ii) também “contribuições” que se tornam públicas (ainda que nem sempre sejam respondidas, e, raramente, as estruturantes são incorporadas à modelagem). O que, então, seria “sigiloso”?

E, principalmente: se tais outorgas (desestatização de autoridades-administradoras portuárias) interessa aos potenciais proponentes, muito mais aos não proponentes (operadores, arrendatários e TUPs compartilhantes da infraestrutura e trabalhadores): esses serão impactados pelo processo e/ou estarão sujeitos à atuação do eventual futuro gestor. De novo: o que justifica tal “sigilo”?

P.s: Inopinadamente o Clythio (Raymond Speranza Backx Van Buggenhout) já não está mais conosco. Figura de proa da comunidade portuária brasileira abre importante lacuna em momento singular do setor e da história do País. Dor e tristeza pela perda do amigo. Descanse em paz; Clythio (João 11:25).

 

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