Frederico Bussinger
O mapa do Brasil já foi dividido no sentido norte-sul pelo Tratado de Tordesilhas (1494). Atualmente o é por uma linha leste-oeste que demarca o limite sul do Arco Norte; expressão que se consagrou e vem despertando interesse crescente.
A linha do Tratado (Belém-PA a Laguna-SC) foi fixada como fronteira entre dois reinos (Portugal e Espanha): um referencial geopolítico, pois. Já a do Arco Norte é linha imaginária na diretriz do Paralelo-16S (Cuiabá-MT, Brasília-DF, Ilhéus-BA). Ante o deslocamento noroeste da fronteira agrícola, o conceito se impôs imaginado como referencial logístico prático: seria o centro de faixa da qual tempos e custos para acesso aos portos do Sul/Sudeste se equivaleriam aos da “Saída Norte”. Apesar de informal, o termo é usado pela imprensa, academia e estatísticas oficiais.
O Tratado reservou a Portugal área de 2,8 Mkm2 (32% do atual território brasileiro); enquanto a do Arco Norte é mais que o dobro: 6,4 dos atuais 8,5 Mkm2 (3/4; 75%). Além de grande número e extensão de unidades de conservação, assentamentos, terras indígenas e quilombolas, essa vasta região abarca diversas sub-regiões com características e vocações mais uniformes; como o emergente MATOPIBA: 73 Mha dos estados de MA, TO, PI e BA.
A saída da atual “tempestade perfeita” que vivemos, o estabelecimento do tal novo-normal e mesmo o futuro do Brasil passa pelo Arco Norte. Foi o que se viu e se debateu em dois recentes eventos: “Arco Norte: desafios e oportunidades” (Instituo de Engenharia de SP); e “As fronteiras do agro e o impacto dos investimentos em infraestrutura no Arco Norte” (Terminal Portuário de Alcântara-TPA e Markestrat).
Não se trata de miragem: a região já é responsável por parcela significativa da produção energética brasileira; bem como da produção e exportação mineral e agrícola. Só de soja e milho, p.ex, em 2019 foram 132 Mt (2/3 da produção nacional); exportados 37 Mt (28%). Nos últimos 10 anos o aumento da produção foi de 2,3 vezes, e de 5,3 nas exportações.
É conhecido o bordão: “Até a porteira a agricultura brasileira é competitiva. O problema está da porteira até o porto”; ou seja, na logística. Esses dados, porém, recomendam melhores análises e explicações: teria a exportação crescido mais que o dobro da produção se a logística, de uma forma ou de outra, não tivesse dado conta do recado? Imagine se a logística fosse mais eficiente!
O desafio logístico do Arco Norte, assim, é transitar de uma logística limitada para uma logística mais eficiente. E isso não apenas para exportações; mas também para o abastecimento da população da região; que padece, também, para levar as crianças à escola, ser atendida na limitada rede de saúde… mormente nas épocas de chuvas. Ou seja, a transformação da logística do Arco Norte transcende o mero escoamento de cargas e transporte de pessoas: pode ser instrumento de reordenação do território, de mudança do perfil da economia e da organização social. Na linha dos “Corredores de Desenvolvimento”, difundidos pelo Banco Mundial e outras agências multilaterais.
Há vários gargalos e desafios nessa trajetória: planejamento e gestão multimodal (tipo projeto do TPA, apresentado); (des)coordenação das ações dos órgãos públicos; pirataria na navegação e roubo de cargas nas estradas; bloqueios de estradas e ferrovias; “funding” para os projetos (em geral bilionários); e estabilidade regulatória (imprevisível). E o estrategicamente mais importante; como destacou a Embrapa: equilíbrio entre o produzir e preservar.
Parodiando conhecida marca esportiva: “just do it”!