Frederico Bussinger
“Deitado
eternamente em berço esplêndido,
Ao som do mar e à luz do céu profundo…”
[do
Hino Nacional brasileiro]
A OAB, estimulada pela pauta da desestatização, vem de realizar (30/SET) webinar para discutir o futuro do Porto de São Sebastião. Aliás, importante registrar, suas diversas unidades, Brasil afora, têm dedicado bom espaço à temática portuária: faço esse registro até com certa dose de inveja, pois não se vê atenção similar das entidades de engenheiros e economistas!
Desestatização foi tema de recente coluna (AT-2/OUT); e as vicissitudes do Porto de São Sebastião, particularmente na última década em AT-25/SET; razão pela qual a iniciativa da OAB foi mais que oportuna. E os debates ao longo das 2h34 bastante ricos (https://drive.google.com/file/d/1HLumXLxX-rUXBslLqyCfu5TDT_mN997h/view).
As virtudes do sítio portuário, entre os melhores do planeta, são praticamente uma unanimidade. Seus três atributos, raros de coexistirem, repetidas ad nauseam: abrigado; não-estuarino (menos dragagens!); com águas profundas (25m; mínimos!). E mais: navios com 2 entradas; 100 km do pujante Vale do Paraíba e rico interior paulista, acessável sem necessidade de se cruzar a metrópole paulistana (com a duplicação da Rodovia dos Tamoios, em curso, melhor ainda).
Paradoxal é que esse potencial vem sendo pra lá de subutilizado; como que ecoando o “deitado eternamente em berço esplêndido” (e seu contexto) do nosso Hino Nacional. Isso, mesmo após o GESP ter investido R$ 290 milhões, desde a delegação (R$ 270m até 2015); pois a movimentação patina: de 489mt em 2007, ultrapassou 800 mt em 08 e 12; mas veio declinando e foi de apenas 742 mt ano passado (pré-pandemia). Como disse um dos painelistas, “o poder público fez os investimentos, mas quem ficou com as margens foram os operadores”.
O desafio maior do Porto de São Sebastião, assim, não é a desestatização! É lograr destravar o processo de seu desenvolvimento para cumprir sua vocação histórica e o papel que a logística brasileira dele demanda.
As elites econômica, acadêmica e da mídia, que desalojaram os caiçaras e “privatizaram” parte relevante do Litoral Norte, já se sabia, vêm explicitamente se opondo à expansão do porto público de São Sebastião. Mas no evento pode-se detectar uma potencial nova armadilha: a ideia de que com “puxadinhos” localizados é possível “chegar lá”; ideia embalada pela (simpática) bandeira/tese do “pé no chão”.
Os artigos anteriores mostraram que, pelo objeto da consultoria, o leque de possibilidades é amplo; ao menos formalmente: é possível fazer quase tudo… inclusive nada!
Mas, cuidando-se das questões trabalhistas, da relação porto-cidade-região-meio ambiente (também objeto de preocupações no webinar), há o que pode ser feito para não se transformar a atual tendência em destino. P.ex: i) Separar-se a condução dos processos de Santos e São Sebastião (aliás, quase uma unanimidade); ii) Não querer reinventar a roda: adotar-se, como ponto de partida, o projeto e o licenciamento existentes; iii) Como nem o governo paulista, nem o federal têm o Porto de São Sebastião como prioridade em suas agendas, adotar-se como modelo “default” a concessão integral: um bom caso onde o tal modelo australiano, tão propalado, pode funcionar; iv) Fazer-se avaliação expedita, com base nos estudos existentes, para fixação de “valor mínimo” da outorga: como, certamente, haverá disputa efetiva, esse valor tem relevância reduzida no processo; v) Antecipar-se o leilão para o início de 2021.
Parodiando conhecida marca esportiva, “just do it”!
(*) Base da intervenção do autor no webinar da OAB.