Frederico Bussinger
“O que não pode ser medido,
não pode ser gerenciado”
[Deming; “pai da cultura da qualidade”]
Tanto o Porto Organizado de Santos (porto público; área e instalações dentro da Poligonal) como o Complexo Portuário santista (Poligonal mais TUPs externos: ou seja, todo o Estuário) seguem se expandindo e têm planos de expansão. O Plano Mestre – PM (ABR/19) trata do Complexo, e o PDZ (JUN/20) do Porto Organizado: isso em tese, visto que, na prática, o PDZ até revisa dados e informações do PM.
Nem sempre as projeções e dados são consistentes mas, em grandes números, é previsto para os próximos 20 anos, até 2040, um crescimento de aproximadamente 50% no Complexo, atingindo-se 240,6 Mt/ano no total. São definidas, também, metas concretas para os principais conjuntos de cargas (pgs. 79-104 do PDZ): contêineres 64% (de 5,4 para 8,7 milhões TEU/ano); granéis sólidos vegetais 37% (95,3 Mt/ano); granéis líquidos 40% (22,4 Mt/ano); granéis minerais 74% (16,5 Mt/ano); e celulose 49% (10,5 Mt/ano). Em suma, um crescimento de capacidades e volumes movimentados nas instalações em algo como 2/3 do atual (80 Mt/ano).
Essa carga adicional prevista, exceto transbordo, obviamente precisará chegar/sair da Baixada Santista; certo? Para tanto os planos preveem rearranjos operacionais e na infraestrutura, do que resultará nova matriz de transportes (pg. 81): 40% ferro (hoje 33%); 47% rodo; 4% duto; e 9% transbordo.
Dito de outra forma: esses aumentos de 80 Mt/ano dependem do crescimento de 37,8% (27,7 Mt/ano) no fluxo rodoviário; estes equivalentes a mais 2.530 carretas de 30 t por dia-calendário (21% do pico). Em recente seminário o representante da Ecorodovias, concessionária do Sistema Anchieta-Imigrantes, estimou em pouco mais: 3.000/dia-calendário; o que apenas agrava o quadro.
Mas a grande transformação proposta/prevista é a quase duplicação da movimentação ferroviária (91%) nos fluxos de/para a hinterlândia (das atuais 45 para 86 Mt/ano): independentemente da expansão das malhas/capacidades da Rumo e da MRS no “hinterland” (planalto e interior), esse fluxo precisará tanto descer/subir a Serra do Mar, pelos 2 sistemas (Rumo e MRS), como entrar/sair da (atual) “Ferradura” (única porta para acesso ferroviário ao Complexo): hoje ela é parte da concessão da MRS, e por ela gerida.
O plano de expansão da MRS, apresentado para renovação antecipada de sua concessão, prevê fluxos de/para o Complexo Portuário (Porto Organizado e TUPs) de: 79 Mt/a (2026); 87 Mt/a (2030); 95 Mt/a (2040). Portanto, considerando a capacidade máxima prevista/comprometida para os 2 sistemas, haveria um “saldo” de capacidade ferroviária de 9 Mt/a em 2040.
Mas essa é, apenas, a ponta do iceberg: além dos projetos e projeções consagrados no PM e PDZ, há tanto expansões previstas para os TUPs existentes, como estudos para implantação de novos TUPs: quase todos eles contando, majoritária ou totalmente, com alimentação ferroviária de/para o “hinterland”.
Alguns são conhecidos; outros ainda não foram trazidos a público ou noticiados pela imprensa. Pelos contratos de adesão (autorizações) já celebrados e/ou requeridos à ANTAQ, todavia, é possível estimar-se só na região de Barnabé-Bagres, p.ex, que TPB, TPL, TRSP, STS e Santorini projetam agregar entre 70-80 Mt/ano de demanda ferroviária!
Foi recentemente anunciado que “Porto de Santos prepara expansão de área” (AT-26/AGO/21); incidental e justamente nessa região das ilhas Barnabé-Bagres e espelhos d´água contíguos: 6,1 milhões de m2 terrestres, sobre os atuais 8,1 Mm2 (75%). Para tanto a Poligonal voltaria a ser alterada, um ano após ter sido revista; agora no contexto da desestatização/privatização: certamente para aumentar/valorizar seus “ativos”.
Para fins de análise de fluxos, entretanto, estarem essas áreas fora (TUPs) ou dentro da Poligonal 8arrendamentos) pouco importa; vez que, supõe-se, se o governo cogita reincorporá-las ao Porto Organizado, não é para ficarem ociosas: seria para utilizá-las visando implantação de novos terminais que, muito possivelmente, terão movimentações similares. Da mesma ordem de grandeza.
Enfim, agregando-se esses projetos, o “saldo” de capacidade ferroviária seria reduzido, eliminado, e o balanço passaria a “déficit”. Aliás, um expressivo déficit que poderia ser de, até, quase o dobro dos 45 Mt movimentados pelas 3 concessionárias, juntas, em 2020!
E não haveria “gatilho” para resolvê-lo, como chegou-se a cogitar: estes são usados para dosar a evolução até um máximo previsto/comprometido. Como os valores considerados já são os máximos, “gatilhos” só seriam eficazes caso esses máximos fossem ampliados: impossível não é; mas tampouco é algo simples. E, ao que se saiba, por ora não está (ainda) cogitado.
Estaria sendo-o na modelagem para a desestatização/privatização? Saberemos em outubro próximo!
Lógico que os cálculos precisam e devem ser conferidos e cotejados no seu conjunto (algo que normalmente não é feito). Mas, não estando eles equivocados, muito provavelmente alguma coisa deixará de acontecer: ou as expansões; ou as implantações; ou a mudança da matriz de transportes.
Ou, alternativamente, novas ações e obras precisarão ser explicitadas ou pensadas… tarefa para um planejamento integrado e para os gestores “deminianos”.