Frederico Bussinger
O Porto Organizado de Santos tem nova poligonal, dois anos após a respectiva Audiência Pública (12/ABR/18). Antes foi a de São Sebastião, que com ele compartilha a licitação do BNDES, em curso, para estudos de desestatização da administração portuária – AP. A de Itajaí, também em estudo, integrara o pacote de 16 portos cujas poligonais foram revistas em JUL/19.
A revisão da poligonal de cada porto tem suas especificidades: as santistas estão pontuadas no release do Ministério da Infraestrutura – MINFRA, base para a cobertura da imprensa. Mas, na verdade, esse processo, iniciado pela Secretaria Especial de Portos – SEP, pouco depois da Lei dos Portos vigente, tornou-se imprescindível para “resolver” um imbróglio por ela mesma criado: TUPs passaram a não poder integrar os portos organizados (art. 2º – IV); enquanto que pela lei de 93 o podiam. E havia/há vários deles.
Um imbróglio, aliás, à primeira vista incompreensível: sendo inequívoco, a partir da nova Lei, que TUPs (como DPW, Brites e Santorini, destacados na reportagem de A Tribuna) podem movimentar cargas de 3º, uma função de característica “pública”, por que impedi-los de integrar portos organizados?
“Porto organizado” é expressão que abarca diversos dimensões: i) três instituições (autoridade-administradora; Conselho de Autoridade Portuária – CAP e Órgão Gestor de Mão de Obra – OGMO) na sua dimensão jurídico-administrativa; e ii) “área do porto organizado” é o rebatimento do jurídico-administrativo sobre o território: “poligonal”, sua envoltória, é um termo/conceito introduzido pela Lei nº 12.815/13 (§ 6º do art. 6º) que, talvez pela inovação, hoje é mais usado que aquele.
Em termos práticos essa poligonal formaliza a nova área geográfica de atuação da Santos Port Authority – SPA (ex-CODESP); do CAP e OGMO santistas. E, por contraste, o que fica fora de suas esferas de competência. Do ponto de vista do modelo, do futuro das desestatizações e direcionamento de investimentos privados em portos, todavia, o mais importante papel das poligonais é estabelecer a fronteira entre dois universos (talvez por isso aponta-se a iniciativa como pró-segurança jurídica!): quem é outorgado via arrendamento (sub-concessão) e quem o é por autorização; quem precisa se submeter a licitação/leilão e quem não; com e sem prazo (para exploração); com e sem bens reversíveis; os que dependem do OGMO ou não; os que devem pagar as “tarifas universais” das Tabelas Tarifárias e os que nem sempre; heteronomia que resultou em algumas disputas, inclusive uma recente em Santos que envolveu Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ e chegou ao TRF-3.
Enfim, a poligonal é a fronteira, bem definida, de dois regimes de exploração portuária que, apesar de poderem ser contíguos geograficamente, são muito distintos; com bem o identificou o recente relatório do Tribunal de Contas da União – TCU.
A poligonal segmenta, inclusive, o escopo de planejamento: quando inicialmente concebidos, os Planos de Desenvolvimento e Zoneamento – PDZ eram para ser o plano estratégico do respectivo porto organizado. Como, em Santos, Estuário e Porto Organizado praticamente se confundiam, não havia dúvida quanto às áreas; desde o primeiro plano, de 1897. Mas já não é mais assim, apesar do intrigante § 2º, art. 11 da recente Portaria-MINFRA nº 61 (que faculta aos PDZs abrangerem “áreas fora do porto organizado” e “que não estejam sob gestão da Autoridade Portuária”).
Menos mal que os Planos Mestres, competência do Poder Concedente, criados no início da década como instrumento para minimizar os papeis dos PDZs, por essa mesma portaria instituiu o conceito de “complexo portuário” (art. 2º; I) que, em Santos, é o Estuário… voltando-se à origem.
No médio prazo vislumbra-se que o PDZ pode passar a papel específico (se não deixar de existir); enquanto o Plano Mestre venha a assumir função de planejamento estratégico com escopo que verdadeiramente faz sentido.